O médico dermatologista e hansenólogo Marco Andrey Cipriani Frade, vice-presidente da SBH (Sociedade Brasileira de Hansenologia), foi convidado pelo presidente da China Leprosy Association, Goucheng Zhang, para ministrar aulas sobre aspectos clínicos da hanseníase para médicos chineses e de outros países asiáticos nas cidades de Taian e Jinan – Província de Shandong, China. Zhang ressalta que a escolha do brasileiro foi motivada pela expertise do tema acumulada pelo docente da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP.
Treinamento
A aula faz parte da agenda do 1º Programa Internacional de Treinamento em Hanseníase, cuja programação vai de 23 de junho a 7 de julho. O evento está sendo organizado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia da China e tem como objetivo debater as novidades em prevenção e tratamento da doença, além de promover parcerias globais para enfrentar os desafios da hanseníase – antigamente denominada como lepra.
O Brasil é o 2° país com maior número de casos de hanseníase, perdendo para a Índia. Por ano, são cerca de 30 mil novos casos, número similar à quantidade de diagnósticos novos de HIV/AIDS anualmente. Ainda assim, a SBH estima que o Brasil tenha de 3 a 5 vezes mais casos do que os registrados oficialmente.
A doença afeta com mais facilidade populações que vivem em aglomerados e, consequentemente, em condições de pobreza, o que facilita a transmissão do bacilo causador da hanseníase. “Mas, como o Brasil não atingiu o controle da doença quebrando a cadeia de transmissão do bacilo, que circula com intensidade em todas as regiões do país, a hanseníase pode vitimar todas as classes sociais, não sendo exclusiva da população mais carente”, alerta Frade, que também é coordenador do Centro de Referência Nacional em Dermatologia Sanitária com Ênfase em Hanseníase, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP.
Negligência
A hanseníase está na lista das doenças negligenciadas e o Brasil é um dos poucos que ainda estão diagnosticando a doença. A SBH tem alertado autoridades mundiais sobre o problema. Em artigo veiculado em uma das maiores revistas científicas mundiais sobre doenças infecciosas – The Lancet Infectious Desease – um grupo de hansenologistas ligados à SBH, dentre eles o professor Marco Andrey, questiona os números da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre a hanseníase. Como a hanseníase é transmitida mais facilmente entre populações que vivem em aglomerados e condições de pobreza, não é possível que países em condições socioeconômicas piores que o Brasil não registrem a doença, alerta o artigo.
Endemia oculta
A SBH denuncia que o Brasil vive uma “endemia oculta” de hanseníase por falta de diagnóstico. Prova disso foi o trabalho, conduzido por Frade e o aluno de doutorado, médico Fred Bernardes Filho, no município de Jardinópolis-SP, vizinho de Ribeirão Preto, com cerca de 40 mil habitantes. A cidade era considerada “silenciosa” para hanseníase até que o trabalho de treinamento/capacitação e busca ativa de casos colocou Jardinópolis dentre as cidades com maior número de casos da doença em 2016, número que já começa a cair frente ao trabalho contínuo de enfrentamento da doença e atenção a pacientes no município, pela Secretaria de Saúde. O projeto, que foi reconhecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e recebeu premiação por ações em favor do SUS, já está em andamento também em Ribeirão Preto-SP, que passou a adotar a mesma metodologia – desde o ano passado, os profissionais de saúde da atenção básica do município começaram a participar de treinamentos/capacitações e já se registra aumento do número de casos novos diagnosticados nas regiões que passaram por treinamento.